domingo, 25 de abril de 2010

Ego inflamável

Será que ainda dá para eu ser convencida? Pois além de ironia , trago comigo uma humildade cansadíssima. Os leitores que passaram rápido pela ironia citada, perguntarão: "Por que convencida?" E eu responderei: "Existe algo mais incrível do que o ponto de vista de um convencido?" Sua vida é perfeita. Se você tem a sorte de sentar ao lado de um convencido no balcão da lanchonete, se prepare! Você sairá de lá renovado, pois acaba de conhecer a pessoa mais interessante da face da terra. Se sentou ao lado dele no ônibus então, ouvirá depoimentos de um incansável vencedor. O convencido só vence, com o perdão do trocadilho. Sim, sua história acabará , fatalmente , com sua vitória. O convencido é antes de tudo um coerente. Além de bonito , legal, charmoso... Até sua derrota é bonita. Seu drama convincente, abala qualquer mero mortal que esteja atrás dele na fila do banco. Portanto, você humilde-que-não-se-ama, saia de casa sempre com um lenço, dica. Mas o que mais invejo no convencido, é o fato de todos terem inveja dele. Seus amigos invejam não só sua atual namorada como todas as que vieram antes. O guardinha da rua inveja seu cabelo e o faxineiro do prédio, suas roupas. Sério! Todos têm inveja do convencido. Inveja e não pena. Afinal de contas, o que seria de nossa vida se não fosse um convencido para mostrar que nossa vida não é nada sem ele? Multi-artista auto-afirmativo da contemporaneidade! Palmas pra ele! Elogiaria agora mesmo um convencido, se não tivesse que pegar senha. Porém há um momento de silêncio na vida do convencido. Quando ele chega em casa à noite e se olha no espelho, sem platéia - sim, porque o motorista , o cobrador, os figurantes do metrô e os ouvidos fatigados dos amigos estão, merecidamente, descansando. Nessa hora o convencido se percebe anão diante do gigante que imaginava ser. Aí, vencido pela própria imagem, o convencido deita e chora. E disso, que no seu teatro diário é seu único ato de verdade, ninguém ficará sabendo.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Mulher

Mulher ouve aqui
a palavra amiga
de um amor, Mulher.
Não se precipita,
que as coisas mesmo
se encarregam de
tomar seu rumo, Mulher.
Pra quê o lamento?
Se chora no meio
sem nem saber do fim,
inverte a ordem.
Porque lágrima que
rola sem motivo
encurta a vida, Mulher.
Se a escolha é sua
e escolhe sorte torta,
escolhe azar. Porque
passarinho de uma asa
não voa.
Ah Mulher!
Se soubesse que sua alegria
colore o mundo.
Se entendesse isso
só por um segundo.
Sua tristeza se envergonharia.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Água Benta

Há a breja no bar, a marvada, a tequila , o whisky , a vodka... Bom, não é esse o assunto principal. Quero mesmo falar dos que bebem. Se há variedade nas bebidas, essa mesma variedade existe nos tipos de bêbados. Há os que choram, os que dormem, os que tingem o chão. Há os que cantam, os que relembram, os que gritam ao portão. Há os que contam segredos e se arrependem, há os já arrependidos - que por isso bebem mais. Há os que se encostam, os que brigam, os que riem, os que refletem , os que mentem, os que amam... E há de se ter nessa singela crônica espaço para os que não bebem. E estes são os que me intrigam mais. Há a força de um padre que se depara com uma tentação, nos que não se deixam levar pelo álcool. E digo mais ! Todos que não bebem devem ter uma religião secreta em que se reze as palavras mágicas do auto-controle. São santidades! Estes , que encho a boca para dizer que são meus semelhantes , exceto pelo fato de não beberem, têm lugar no céu. Definitivamente. Indubitavelmente. Quanto a mim - pobre de mim! - que escrevo com a direita e com a esquerda seguro um copo triste, já no fim. Vivo um impasse, não sei em qual perfil dos bêbados acima listados, me encaixo.